Fonte: Jota
Por Alexandre Leoratti
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) manteve uma liminar que suspende uma cobrança de R$ 5,9 bilhões contra a Ambev. Trata-se de um caso envolvendo amortização de ágio gerado após a cervejaria belga Interbrew adquirir o controle da então empresa brasileira. A decisão, assinada pela juíza federal Marli Ferreira, data de 13 de agosto.
A amortização de ágio ocorre após a aquisição de uma companhia a um preço maior do que o valor demonstrado no balanço. Com isso, o comprador faz uma aquisição com base na expectativa de rentabilidade futura, que tem como consequência a possibilidade de abatimento do valor extra das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Ao manter a liminar concedida pela primeira instância, a juíza federal afirmou que não é possível julgar por meio de liminar se houve um planejamento tributário abusivo da Ambev, com o objetivo exclusivo de não pagar tributos, já que é necessária a análise do conteúdo probatório sobre as transformações societárias da empresa.
“Não pode o Relator, avançar nessa seara que depende evidentemente de dilação probatória, para identificar as várias transformações pelas quais passou a empresa originária brasileira, e quais os elementos contábeis que devam ser considerados para efeitos de recolhimento de IRPJ e CSSLL”, afirmou a juíza federal na decisão.
A fusão da empresa belga com a Ambev deu origem ao grupo Inbev. As operações societárias, que ocorreram entre 2005 e 2010, envolveram uma série de ofertas públicas de ações e aumento de capital bilionário diretamente no capital da Inbev.
A Receita Federal, entretanto, entende que os ágios amortizados eram decorrentes de operações simuladas. Com isso, conforme consta na decisão judicial, a fiscalização considera que o contribuinte tentou “amortizar a perda de um investimento inexistente”.
A fiscalização também afirma que as operações societárias geraram um segundo ágio após a Inbev transferir ações da Ambev para uma outra empresa do grupo, a IIBV. Com isso teria ocorrido um ágio interno, ou seja, um ágio envolvendo partes relacionadas.
“Analisando a engenharia societária adotada pelo grupo empresarial, observa-se
que a empresa INBEV BR foi utilizada como verdadeira “empresa veículo”, ou seja, ela foi utilizada como mero instrumento para tentar dar aparência de legalidade – ao ágio que seria indevidamente amortizado”, assevera o relatório da Receita Federal.
No formulário de referência do primeiro semestre de 2020 a Ambev caracteriza a chance de perda no processo judicial como “possível”.
Carf
A Ambev recorreu ao Judiciário com o objetivo de suspender a cobrança após perder no Carf em agosto de 2019. Na ocasião, por voto de qualidade, o tribunal administrativo considerou que houve planejamento tributário abusivo da companhia durante as operações societárias com a Interbrew.
O voto vencedor foi proferido pela conselheira representante do fisco Edeli Pereira Bessa, da 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais. A julgadora votou para manter a multa qualificada a cobrança relacionada à amortização do ágio.
Para ela, há evidências que o grupo empresarial “valorizou esta vantagem fiscal e, apesar de conscientes da natureza interna do ágio constituído, valeram-se dele, por meio de amortizações, para auferir ganhos significativos à custa da erosão das bases tributáveis no Brasil”.
Poucas decisões judiciais
Para o tributarista Matheus Bueno, sócio do Bueno & Castro Tax Lawyers, o Judiciário emite um sinal positivo aos contribuintes ao não tomar uma decisão sobre a cobrança por meio de uma liminar.
“A decisão foi no sentido de que já existe uma garantia por fiança bancária da Ambev no valor de R$ 5,9 bilhões. Deixar a cobrança andar gera mais prejuízo para a empresa do que para o fisco”, afirmou o tributarista.
Para Alberto Medeiros, sócio do Stocche Forbes Advogados, o caso ainda não representa um precedente importante por não ter o mérito julgado. “Entretanto, é um caso relevante porque além do valor econômico também mostra de forma clara o antagonismo de posições em relação ao aproveitamento do ágio. É um caso clássico de ágio que o Judiciário terá a oportunidade de fixar um entendimento”, afirmou o tributarista.