Fonte: Migalhas
É possível ao município obter certidão positiva de débitos com efeito de negativa quando a câmara municipal do mesmo ente possui débitos com a Fazenda Nacional. Esse foi o entendimento dos ministros do STF, por maioria, em julgamento no plenário virtual.
O voto condutor foi do ministro Edson Fachin, seguido por Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Celso de Mello.
O município de São José da Coroa Grande/PE ajuizou ação cautelar em face da União, a fim de obter a CPD/EN – Certidão Positiva de Débitos com Efeitos de Negativa, desconsiderando os débitos fiscais ou irregularidades por obrigação tributária acessória praticada pelo Poder Legislativo Municipal.
A União sustentou que denegou a expedição da CPD/EN, em razão de irregularidades relacionadas à GFIP – Guia de Recolhimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e Informações à Previdência Social emitidas pela câmara municipal.
O município, por sua vez, aduziu que a negativa tem causado sérios prejuízos, na medida em que fica impedido de receber os repasses relativos a vários convênios firmados com a União.
O Tribunal de origem julgou procedente a ação por vislumbrar risco de lesão grave e de difícil reparação. Posteriormente, embargos de declaração pela União foram desprovidos. Irresignada, interpôs RE em que aponta violação aos arts. 2º, 29 e 31 da CF.
Relator
Em seu voto, o relator, ministro Marco Aurélio, ressaltou que a permissividade no descumprimento de deveres subverte a lógica do federalismo cooperativo, no que se revela essencial o cumprimento de obrigações assumidas reciprocamente, dando ensejo a abalo sistêmico do Estado nacional, carente de boa governança nas contas públicas.
“Não se pode potencializar argumentos metajurídicos, considerada a renitente crise financeira enfrentada pela quase totalidade dos entes federados, para ter-se a chancela, pelo Supremo, guarda último da CF, do inadimplemento de obrigações pactuadas, sob pena de agasalhar verdadeira moratória à margem da legislação de regência.”
Assim, conheceu do RE e o proveu propondo a seguinte tese:
“Surge constitucional restrição, imposta a município, à obtenção de certidão de regularidade fiscal, em decorrência de débito da Câmara de Vereadores.”
Divergência
Os ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes abriram divergência, negando provimento ao recurso.
Fachin destacou que, de acordo com a jurisprudência do STF, é aplicável o princípio da intranscendência subjetiva das sanções financeiras em matéria de limites setoriais de gastos com pessoal aos poderes com autonomia financeira, a despeito da personalidade jurídica una do ente federativo, pois o Executivo não dispõe de meios para ingerir na execução orçamentária dos demais órgãos autônomos.
“Ressalto, neste contexto, a ADIn 2.238 em que esta Corte suspendeu a eficácia do art. 9, § 3º, da lei de responsabilidade fiscal, que previa a possibilidade de o Poder Executivo limitar os valores financeiros dos demais Poderes, quando estes não promovessem a limitação no prazo estabelecido no diploma normativo, conforme critérios da lei de diretrizes orçamentárias.”
Assim, propôs a fixação da seguinte tese:
“É possível ao município obter certidão positiva de débitos com efeito de negativa quando a mâmara municipal do mesmo ente possui débitos com a Fazenda Nacional, tendo em conta o princípio da intranscendência subjetiva das sanções financeiras.”
Os ministros Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Celso de Mello seguiram a divergência.
O ministro Alexandre de Morais, também ao negar provimento ao recurso, entendeu que, em face do princípio da separação dos poderes e do postulado da intranscendência das sanções, não se pode responsabilizar o Executivo municipal por obrigações da Câmara de Vereadores, sob pena de ofensa àqueles mandamento constitucionais.
Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso seguiram a divergência de Moraes, que propôs a seguinte tese:
“Assiste ao Poder Executivo Municipal o direito de obter Certidão Positiva de débito com efeitos de negativa, ainda que o Poder Legislativo (Câmara de Vereadores) esteja inadimplente em relação às suas obrigações tributárias.”
Processo: RE 770.149