O título do presente boletim indica a preocupação com a tributação incidente sobre os bens deixados por herança, uma vez que os Estados, que são titulares do ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos, antecipando-se à reforma tributária, encaminham alteração legislativa tendente a elevar a alíquota desse imposto.
É o caso do Estado de São Paulo que, mediante o Projeto de Lei nº 250/2020, em tramitação na Assembleia Legislativa, entre outras medidas, pretende elevar a alíquota do ITCMD paulista de 4% para 8%, que representa a alíquota máxima definida pela Resolução nº 9/1992 do Senado Federal.
No campo das cogitações, revela-se bem provável a aprovação do aludido projeto de lei, porquanto essa providência se insere no contexto das atuais reformas tributárias.
Não tem sentido determinar a reforma do imposto sobre consumo, do imposto sobre a renda etc., e não interferir no imposto incidente nas transferências patrimoniais derivadas da sucessão familiar.
O imposto em questão, como visto, radica em torno do vocábulo suceder, que significa substituir, ou seja, alguém tomar o lugar de outro.
No seu âmbito jurídico, como observa a doutora Maria Berenice Dias[1], a palavra sucessão representa a substituição do titular de um direito, com relação a coisas, bens, direitos ou encargos.
Quanto ao patrimônio familiar, leciona a doutora Priscila M.P. Corrêa da Fonseca[2] que “a sucessão pode ser regulada, ainda em vida, por seu autor, tendo o conjunto de medidas adotadas com esse objetivo o título ou o nome de planejamento sucessório” [destaque acrescido].
O termo planejamento, por sua vez, representa a decisão e as medidas adotadas no presente com a pretensão de interferir ou estabelecer o controle dos atos que ocorrerão no futuro.
No caso, em vez de aguardar o inventário, que contém inúmeros inconvenientes, a família reunida pode decidir pela prévia estruturação sucessória, tudo voltado para lograr a adequada divisão da herança, preservando os herdeiros das controvérsias e conflitos inerentes a toda e qualquer concorrência sucessória.
Isso pode ser ultimado mediante a constituição de uma sociedade holding, a partir da autorização prevista no art. 2º, § 3º, da Lei das Sociedades Anônimas – Lei nº 6.404/76, que se aplica à sociedade por responsabilidade limitada, desde que no seu contrato seja gravada a aplicação supletiva da Lei de S.A.
De um modo geral, as holdings são classificadas em puras ou mistas. A holding pura é aquela que tem por finalidade única a participação no capital de outras sociedades, não desenvolvendo ela qualquer atividade econômica. A holding mista, como indica o termo, é aquela que, a par da participação no capital de outras sociedades, desenvolve outras atividades empresariais.
Na prática, aconselha-se a não utilizar a holding mista, criando-se duas sociedades holdings, a patrimonial e a societária. Essa divisão se revela muito importante no ato de venda da sociedade operacional (indústria, por exemplo), porquanto poderá ser pactuada sua venda indireta, mediante a alienação das quotas da holding societária, que estão em poder das pessoas físicas.
Criada a empresa holding, pode ser encaminhada a sucessão mediante a doação das suas quotas aos herdeiros, com a previsão de cláusulas que garantam o controle e poder em nome do doador, pai ou a mãe, ou ambos.
Dessa forma, do ângulo formal, a sucessão resta consumada; do ângulo material, a efetiva sucessão fica atrelada/postergada para a data da morte do doador, que retém em vida os direitos da governança, dos direitos políticos e econômicos, em face da sociedade holding, tudo ancorado no usufruto vitalício.
Diante do exposto, em face da iminente elevação dos impostos que incidem sobre a herança, chegou o momento de essa questão ser enfrentada, com a adoção dos instrumentos legais que regulam o planejamento da sucessão patrimonial das famílias, ora apresentados, em rápida e sucinta compilação.
Ferreira E Ferreira Advocacia
Antonio Airton Ferreira
Simone de Oliveira
[1] Manual das Sucessões. Revista dos Tribunais, 5ª edição, p. 29.
[2] Manual do planejamento patrimonial das relações afetivas e sucessórias, Revista dos Tribunais, 2ª edição, p. 231.