Fonte: Jota
Por Jamile Racanicci e Bernardo Gonzaga
Apesar de prometer uma simplificação, a reforma tributária proposta pelo Ministério da Economia, que unifica PIS e Cofins na Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), preserva isenções e regimes especiais. Com a aprovação do projeto estariam mantidas isenções sobre a cesta básica, sobre serviços de saúde custeados pelo SUS, sobre serviços de transporte coletivo de passageiros e para entidades beneficentes de assistência social e templos religiosos. Quanto aos regimes especiais, os setores de combustíveis e cigarros continuarão no regime monofásico – em que uma empresa é responsável por recolher o tributo em nome de toda a cadeia produtiva.
O PL 3.887/2020 tramitará na Câmara dos Deputados “silmutaneamente” à PEC 45/2019, que já está em análise na Comissão Especial. Por ser um texto infraconstitucional, ele tem processo próprio para ser aprovado – pode ser votado direto em plenário mediante acordo de lideranças e exige maioria simples para aprovação. A PEC 45/2019 exige aprovação da comissão especial e depois em dois turnos pelo plenário, com votos de ao menos 308 deputados – e depois é preciso aprovação da CCJ e do plenário do Senado em dois turnos com 49 votos. A expectativa é de que ele seja discutido e seu conteúdo final seja negociado junto com a PEC 45/2019 (e com a PEC 110/2019, do Senado ainda parada na CCJ) por ser parte da reforma tributária.
O texto proposto pelo governo será incluído em uma única PEC que será escrita pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e, além do texto de Guedes, contará com propostas da PEC 45/2019 e 110/2019, que já tramitam no Congresso. “Vamos trabalhar para, se Deus quiser, aprovar ainda neste ano nas duas Casas uma reforma que traga um sistema mais justo”, disse o relator ao acompanhar Guedes na entrega do texto no Congresso na tarde desta terça-feira (21/7).
O novo sistema proposto pelo governo federal será não cumulativo e permitirá o aproveitamento de todo e qualquer crédito vinculado à atividade empresarial. O crédito é permitido até no caso de aquisições de bens e serviços comercializados por empresas optantes do Simples Nacional.
“O tributo incidente nas etapas anteriores e destacado no documento fiscal permitirá o creditamento para abatimento das contribuições incidentes nas etapas posteriores”, lê-se na justificativa do projeto de lei, assinada pelo ministro Paulo Guedes. De acordo com a proposta, o prazo é de cinco anos para a utilização dos créditos.
Por outro lado, segundo o PL é proibido tomar créditos de CBS sobre aquisições que não forem oneradas pela nova contribuição. Ou seja, o crédito é vedado caso a operação anterior não sofra incidência da nova contribuição. As exceções para esta regra, conforme determina a Constituição, são exportações e vendas à Zona Franca de Manaus. Isso quer dizer que as empresas podem tomar créditos de CBS no caso de exportações e vendas à zona de livre comércio.
Como regra de transição, o texto permite que a empresa use o saldo de créditos apropriados com base na legislação anterior. O PL também autoriza que a empresa se aproprie de créditos calculados sobre a depreciação ou a amortização de ativos adquiridos antes da entrada em vigor da CBS. Ainda, podem ser aproveitados créditos sobre devoluções de vendas efetuadas anteriormente à CBS.
Exceções na reforma tributária: isenções e regimes especiais
Em coletiva de imprensa o secretário da Receita Federal, José Tostes Neto, defendeu nesta terça-feira que por meio da proposta o governo está “dando passos significativos e concretos na direção da simplificação dos tributos”. Isso porque a criação da CBS resolveria três relevantes pontos causadores de conflitos judiciais, como o conceito de insumo de PIS e Cofins, a exclusão do ICMS e do ISS da base de cálculo das contribuições e o conceito de receita total sujeita à tributação.
Segundo o secretário, o novo modelo reduz o número de regimes especiais de 100 para cerca de meia dúzia. Quanto ao número de obrigações acessórias, a assessora especial do ministro da Economia Vanessa Canado afirmou que, após a reforma, o número de campos preenchíveis na nota fiscal cai de 52 para nove. Quanto às declarações entregues em ambiente eletrônico, o total de 1.289 campos preenchíveis será reduzido para 230.
O PL 3.887/2020 prevê isenção de CBS sobre a cesta básica, sobre serviços de saúde custeados pelo SUS, sobre serviços de transporte coletivo de passageiros e para entidades beneficentes de assistência social e templos religiosos. Ainda, no caso de produtos agropecuários in natura vendidos por produtores rurais e na contratação de transportadores autônomos, o comprador dos bens e serviços pode calcular crédito presumido.
De acordo com Canado, o governo não abandonou a proposta de substituir a isenção dos produtos da cesta básica por uma devolução do valor pago em tributo para famílias de baixa renda inscritas em programas de transferência de renda. Em vez de incluir a proposta no PL que cria a CBS, o governo preferiu promover a alteração na criação do programa Renda Brasil, que após a pandemia deve substituir o Bolsa Família e programas como o abono salarial.
Quanto aos regimes especiais, os setores de combustíveis e cigarros continuarão no regime monofásico – em que uma empresa é responsável por recolher o tributo em nome de toda a cadeia produtiva. Isto é, terão incidência monofásica produtores e importadores de gasolina e derivados do petróleo e gás natural, tais como óleo diesel, gás liquefeito de petróleo (GLP), querosene de aviação, biodiesel e álcool. Também serão sujeitos à incidência monofásica os setores de cigarros e cigarrilhas.
Como a concessão de benefícios fiscais na Zona Franca de Manaus está prevista na Constituição, o PL não altera os incentivos da zona de livre comércio. Além disso, permanece a desoneração de operações envolvendo a geração e a comercialização de energia pela hidrelétrica de Itaipu, que está prevista em tratado internacional de 1973.
Entidades financeiras, como bancos, planos de saúde e seguradoras, mantêm a forma de apuração antiga com alíquota de 5,9%. Segundo o Ministério, isso se justifica porque essas entidades não geram ou se apropriam de crédito. O PL ainda proíbe que empresas tomem crédito sobre a aquisição de bens sujeitos ao regime monofásico e sobre valores pagos a instituições financeiras.
Ficam de fora da contribuição do CBS condomínios de proprietários de imóveis, instituições filantrópicas e fundações, entidades representativas de classes e conselhos de fiscalização de profissões, serviços sociais autônomos, sindicatos e partidos políticos.