Fonte: Jota
Por Jamile Racanicci
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar na tarde desta quarta-feira (12/8) como devem ser calculados os juros quando o contribuinte inscreve uma dívida no Refis e, por quitar o débito à vista, é beneficiado com redução de 100% no valor das multas. Em resumo, os ministros vão decidir se os juros que incidem sobre a multa devem ser perdoados junto com ela ou apurados separadamente, recebendo apenas o desconto de 45% especificado na lei de 2009 que criou o Refis da Crise.
No julgamento do EREsp 1.404.931, os ministros definirão como deve ser interpretada a lei 11.941/2009, que instituiu o Refis da Crise e serviu de base para a edição da maioria das leis posteriores que criaram parcelamentos semelhantes. O julgamento foi suspenso nesta quarta-feira por pedido de vista após o placar ficar empatado em 1X1. Não há data prevista para retomada.
Segundo a Fazenda Nacional, um resultado favorável aos contribuintes obrigaria a União a devolver às empresas 5% de todo o valor arrecadado em 2009 com o Refis da Crise. Ainda, a procuradoria estimou em R$ 3 bilhões o impacto fiscal de uma derrota na disputa sobre o cálculo dos juros relativos ao Pert, Refis realizado em 2017 em que foram parcelados débitos fiscais de períodos em que a taxa Selic estava mais baixa do que em 2009.
“O reflexo fiscal em relação à lei 11.941/2009 seria muito superior”, afirmou procuradora da Fazenda Amanda Geracy em sustentação oral.
Por outro lado, o advogado Carlos Eduardo Domingues, que representava o contribuinte, defendeu que o sistema tributário brasileiro é estruturado pelo Código Tributário Nacional (CTN) de maneira que os valores acessórios dependem do principal. Nesse sentido, não haveria como preservar a cobrança dos juros se a própria multa que lhes deu origem foi afastada.
“Só pode haver crédito tributário se houver obrigação principal, do tributo em si, ou obrigação convertida em pena pecuniária pelo seu descumprimento. Não existe parcela autônoma referente aos juros. Estão interpretando a lei 11.941/2009 como se os juros compusessem uma parcela especial do crédito tributário”, argumentou.
A 1ª Seção reúne os dez ministros do STJ especializados em julgar matérias de Direito Público. Ao passo que a 2ª Turma do STJ vinha decidindo a controvérsia de forma favorável à Fazenda desde 2015, a 1ª Turma se posicionou a favor da metodologia defendida pelos contribuintes em 2018.
Como as duas Turmas tomaram decisões em sentidos diversos, o posicionamento da 1ª Seção pacificará a controvérsia no âmbito do STJ.
Segundo a procuradoria, o julgamento no STJ é especialmente relevante porque a questão dificilmente chegaria ao STF. Isso porque em geral o Supremo avalia que controvérsias relativas a particularidades de parcelamentos tributários constituem matéria infraconstitucional.
Diferença de cálculos no Refis da Crise
Nos embargos de divergência, os ministros debatem se os descontos para multa, juros e encargos legais concedidos pela lei devem ser aplicados sobre o valor nominal da dívida, apurado quando foi constituído o crédito tributário, ou sobre o valor do débito atualizado pela taxa Selic da constituição do crédito tributário até o pedido de adesão ao Refis.
Entre a consolidação do crédito tributário e a adesão ao Refis, período que pode durar mais de cinco anos, as dívidas fiscais são atualizadas pela taxa Selic. A taxa é aplicada ao principal, à multa e aos juros já acumulados entre a data do vencimento do tributo e a consolidação do crédito.
Supondo que um débito tenha sido inscrito em Dívida Ativa em 2005 e parcelado no Refis da Crise em 2009, caso o perdão da multa seja concedido sobre o valor nominal do crédito tributário, o valor da multa já seria R$ 0 desde 2005.
Dessa maneira, seria perdoada conjuntamente a parte dos juros que corrigiriam a multa até a adesão ao Refis, em 2009. De acordo com a Fazenda, a metodologia mais benéfica aos contribuintes elevaria o desconto dos juros de 45% para, na prática, 68,5%.
Assim, a Fazenda defende que o desconto de 45% seja aplicado apenas depois da correção pela taxa Selic de 2005 a 2009. Ou seja, pela metodologia do fisco os juros relativos à multa continuariam sendo devidos ainda que a penalidade tenha sido perdoada.
Empate em 1X1
O relator do caso, ministro Herman Benjamin, votou pela metodologia defendida pela Fazenda Nacional, por entender que caso contrário se tornaria inócua a determinação legal de que o desconto aos juros seja de 45%.
“A redução dos juros de mora em 45% deve ser aplicada após a consolidação da dívida sobre o próprio montante devido originariamente a esse título – juros de mora -, não existindo amparo legal para que a exclusão de 100% das multas de mora e de ofício implique na exclusão proporcional dos juros de mora sem que a lei assim o tenha definido de modo expresso”, concluiu.
Abriu divergência o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, ao votar favoravelmente à metodologia defendida pelos contribuintes. Para o ministro, o fisco não tem o poder de alterar a regra ‘multissecular’ do Direito segundo a qual o acessório segue a sorte – ou o azar – do principal.
“Não adianta a norma dizer que o rabo não é acessório do cachorro e que o cachorro é acessório do rabo. A norma somente terá eficácia se for admitido envergamento do significado do instituto multissecular”, afirmou.
Logo em seguida a ministra Regina Helena Costa pediu vista antecipadamente e o julgamento foi suspenso.